...É o fundo do poço, é o fim do caminho. No rosto o desgosto, é um pouco sozinho...
.......(Águas de Março – Tom Jobim)
....... Quando março chegou. Março nos remete à música imortalizada na voz de Elis Regina e que diz sobre o “fundo do poço”. A chegada de março de 2020 assim nos pareceu, uma vez que trouxe para o Brasil a decretação da quarentena e instalou um temor generalizado. No dia 17 foi registrada a primeira morte por Covid-19, apenas três dias depois já se contavam onze outras e o estado já era de transmissão comunitária. Pareceu de fato o fim. Os aeroportos pararam, as pessoas sumiram das ruas. O governador de São Paulo impõe a quarentena no dia 24, tudo muda radicalmente na rotina da vida e o silêncio se instala em toda a metrópole, como que vaticinando que se iniciaria um período só comparado àquele da “gripe espanhola”, do início do século passado.
.......As mudanças impostas pela crise da Covid-19 foram materializadas rapidamente na forma de conviver, trabalhar e até mesmo de sair às ruas. Num piscar de olhos surgiu uma espécie de novo grupo étnico, o “grupo de risco”, que segregou um contingente de ditos vulneráveis, de todas as cores, credos e formações, trabalhadores ou desempregados. Escolas pararam com as aulas, o comércio foi fechado, escritórios ficaram às moscas e se deu uma corrida ao novo acessório de vestimenta, as máscaras. Surge o símbolo-mor da mutação nas relações sociais, os sistemas de videoconferência para fazer o que só fazíamos presencialmente.
.......No setor de agregados, particularmente para os produtores de pedra britada, que vinham de um 2° semestre de 2.019 mostrando consistente ascensão de volume demandado pelo mercado consumidor, março representou o paradoxo de encerrar um 1° trimestre de 2.020 que, ao tempo em que parecia encerrar uma crise de mais de cinco anos no setor, também apresentava o caminho do “fundo do poço”. O temor estava também instalado em nossos negócios que, como tantos outros, era alimentado negativamente a cada nova entrevista de início de noite protagonizada pelo então ministro da Saúde, o médico Mandetta.
.......Algum tempo depois de março. Transcorridos seis longos meses desde o fatídico 17 de março, nos deparamos com os produtores de agregados integrando parte do alicerce que representa hoje a indústria da construção para a economia do país. Estamos crescendo ao ritmo de 12% em relação a 2019, projetando volumes de consumo na Região Metropolitana de São Paulo que são os maiores desde 2015 e, incluso que o setor foi no rol de atividades essenciais logo no início da pandemia, logramos atravessar a crise fortalecidos e mais confiantes. Uma confiança que estamos mantendo para 2021, com presumíveis 8% de crescimento, crendo que há razões para tanto, dentre elas a retomada de obras importantes como as do Metrô e Rodoanel – Trecho Norte, nos investimentos que serão direcionados ao saneamento básico e às obras generalizadas da construção civil.
.......E ainda que a pandemia flerte com a resiliência, agora nossos maiores temores são outros e decorrentes de ações governamentais que nos parecem ter “sinais trocados”. Quando o desejo é de reaquecer a economia, derrubar a perplexidade representada pelo número de 13 milhões de desempregados (com possíveis 10 milhões acrescidos pelo contingente daqueles que não mais procuram uma vaga, conforme informa a Fiesp!), as ameaças são outras. Elas estão vindo, por exemplo, de algumas medidas de governo como a suspensão de pesagem nas balanças das rodovias (que estimula a transgressão da lei, transportando de forme impune com excesso de peso e desestimula nosso programa de autorregulação, o “Movimento Responsabilidade de Peso”), no Decreto n°65.156/2020 (revoga a redução da base de cálculo do ICMS para brita e areia, promovendo na prática aumento de imposto, cuja alíquota estava em vigor desde o longínquo 1.994!) e no PL n°529/2020, que hoje tramita na Assembleia Legislativa e pode acarretar aumento de impostos em muitos produtos, incluindo nos materiais de construção.
.......Deduzindo as mazelas de 2020 e somando as nossas expectativas para 2021, o saldo é positivo e indica que, por ora e cautela, será melhor terminar como começamos, que Elis Regina também imortalizou:
...A esperança dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha
Pode se machucar...
.......(O Bêbado e a Equilibrista - João Bosco e Aldir Blanc)