.......O cenário político-econômico do país, nas últimas semanas, foi tomado pelas discussões da proposta de reforma tributária, em tramitação na Câmara dos Deputados. O clima, como não poderia deixar de ser, era de franco apoio à reforma, até porque, como dito por vários economistas, o sistema vigente no Brasil é um “manicômio tributário”. Desde a Constituição de 1988 teriam sido criadas 420 mil normas tributárias, um legado normativo-burocrático que impõe ao contribuinte brasileiro – e às empresas que aqui se mantêm teimosamente vivas – custos, incertezas e a indispensável necessidade de suporte especializado de uma diversidade de profissionais, particularmente de contadores e advogados tributaristas. E, ainda assim, não raras vezes não se sabe ao certo se os recolhimentos feitos estão conformes diante das sutilezas e interpretações suscitadas pelo aparato legal vigente.
.......Diante de um cenário desses, apoiar uma mudança que venha conferir simplificação, clareza, agilidade e justiça tributária parece-nos conduta que tem indubitável aval dos agentes econômicos, setores produtivos e cidadãos do país. Nossas entidades – Sindipedras e Sindareia – e as diferentes representações da indústria foram convidadas pela FIESP a subscrever manifesto em apoio à reforma, que seria publicado nos jornais no dia 06/07/2023. Conferir apoio a essa iniciativa da FIESP era o único, racional e lógico caminho para todos aqueles que pensam no país. Naquele momento, no entanto, o texto final da reforma que seria votada pela Câmara dos Deputados, no dia seguinte, ainda não era conhecido. E, embora elogiado, o texto do relator passava por negociações e governadores de estados importantes da Federação levantavam dúvidas e faziam objeções sobre alguns pontos importantes da reforma, dentre eles o próprio governador de São Paulo.
.......O ímpeto e o desejo de manifestar apoio integral à proposta, na visão de nossas entidades, não poderia ser cego e fundamentado na confiança de que a reforma esperada incorporava todos os ingredientes já citados. Ainda que a sociedade brasileira ansiasse já de há décadas pela promoção dessa reforma, o fato era que subsistiam dúvidas importantes a superar. Reservamo-nos, então, o direito da cautela, não por temores em causa própria – até porque a expectativa é de que o setor de agregados deverá ter aumento de carga tributária – mas pelas surpresas de última hora sempre possíveis de se materializarem nas votações do Congresso Nacional. “Jabutis em árvores” não são exatamente novidades no nosso Legislativo e os exemplos são muitos.
.......Vale lembrar, a propósito, que em 2002 o setor de agregados teve quebrada a isonomia na tributação do PIS/COFINS, atingindo de forma diferente empresas que operavam no lucro real e lucro presumido, não obstante a promessa de legisladores de que as alterações que seriam promovidas na lei “não implicariam em aumento da carga tributária”. Ledo engano, a carga tributária cresceu em até 80% para as empresas que operavam no lucro real. Foi necessário muito empenho e mais de uma década para que a situação fosse revertida pelas Leis de n°12.693/2012 e n° 12.766/2012, permitindo que a partir de 01.03.2013 as receitas decorrentes de operações de comercialização de agregados pudessem voltar à apuração do PIS/COFINS mediante as aplicações das alíquotas de 0,65% e 3,00% sobre o faturamento.
.......Retornando à reforma que transitou pela Câmara dos Deputados, infelizmente o temor de surpresas de última hora se materializa e justificativas foram apesentadas nas vozes dos governadores do Mato Grosso e de Goiás, partes presumivelmente beneficiadas com o quelônio figurativo e legal colocado no texto da reforma. Nela foi incluso o artigo-20 e que permite cobrar um novo tributo por parte dos governadores. Percebida a mudança que desfazia o compromisso de não aumentar a carga tributária, o Instituto Brasileiro de Mineração - IBRAM foi o primeiro a se manifestar e alertar, informando que o novo dispositivo “contraria a própria reforma e aumenta a carga tributária". Seguiu a mesma entidade, que representa a maior parcela dos responsáveis pelo PMB – Produto Mineral Bruto do país, informando que esperava "...que a votação pelo Senado Federal seja antecedida por um diálogo com a mineração e o setor agro e que tal artigo venha a ser suprimido da matéria da reforma tributária”. (O Estado de S.Paulo -/2023/07/07).
.......A cautela, o comedimento e a dúvida de nossas entidades diante da votação da reforma tributária se mostraram, até agora, procedentes. Ainda que o art.20 tenha aplicação restrita aos entes federados com taxações já vigentes sobre o faturamento da mineração e agronegócio até abril passado - na justificativa de seus defensores para investimentos em infraestrutura - paradoxalmente vem nos colocar em catarse de desapontamento: como acreditar nos compromissos dos legisladores se a história se repete, com fatos desdizendo o que afirmam?
.......Os fatos ainda que endossam nossos temores de que o prometido nem sempre é cumprido, por outro lado não podemos deixar de reconhecer a existência de momento propício para desfazer o “manicômio tributário” brasileiro. É desta forma que nos alinhamos com a ideia central do citado Manifesto da FIESP, que preconiza que “Todos os setores econômicos e sociais vão ganhar se o país tiver um sistema tributário racional, o que há muitos anos deixou de existir. ”
.......Nós também, do setor de agregados, esperamos por esse sistema racional e ficamos na expectativa de que o Senado Federal possa, ao final, confinar no cercadinho da tributação os quelônios gestados extemporaneamente pelos parlamentares que se esqueceram do compromisso de que não haveria aumento de carga tributária.